St. Vincent usa o vídeo de “Digital Witness” (testemunha digital, em tradução livre) para criar um retrato impressionante do mundo atual – um retrato de alguém cuja desesperada necessidade de atenção e afirmação tem metástase no vício em mídias sociais.
Annie Clark disse que a canção “encapsula esta ideia de como nós nos tornamos muito dependentes de outras pessoas […] um milhão de olhos digitais, validando nossa experiência”. As letras são um comentário claro a respeito das mídias sociais, incluindo a própria experiência de Clark em sites como o Twitter, que ela descreve como “patética”. “Qual a razão para dormir se eu não posso mostrá-lo, se você não pode me ver?” Clark canta no refrão. “Qual a razão de fazer alguma coisa?”.
Em entrevista ao site Oyster, ela afirma que em um sentido existencial, as letras questionam como as pessoas avaliam o que é e não é importante na era digital. De alguma forma, diante dessa visão um pouco pessimista da nossa época – e por isso, talvez, a escolha de cores apáticas para representar um futuro não muito empolgante – o clipe consegue ser ameaçador e reconfortante ao mesmo tempo. Na visão distópica do futuro, há obviamente algum tipo de totalitarismo – as personagens batendo copos vazios e homens uniformizados marchando em sincronia na rua – mas, claro, é livre para interpretações.
Aqui, Moya cria um universo repleto de efeitos especiais, unindo imagens de locações reais com o pós-tratamento (veja abaixo no Making Of, como foi o processo de gravação) e merece um lugar de destaque entre os ícones da história do videoclipe (inclusive, desfilou entre os melhores de 2014 em diversos sites de música como a Rolling Stone).
O que separa este clipe de outros tantos é seu tom levemente apocalíptico, a magnitude e, principalmente, a força da produção visual. Seu uso inteligente de cores atenuadas e a movimentação sútil da câmera no enquadramento do rosto hipnótico de Clark cria uma identidade visual única ao clipe. É claro que não teria funcionado sem a própria cantora, gloriosa em seu visual impar – cabelo cinzento, volumoso e marcante – como o centro das atenções.
O diretor Chino Moya aplica seu amor aos espaços claustrofóbicos ao mundo crítico de Annie Clark, onde (como na maioria de suas canções) por trás de uma bela casca de ovo, esconde algo ansioso e tenso. O resultado é um clipe neurótico disfarçado de calmo. Elogiado, merecidamente por seu apelo visual e crítico sutil também de outros vídeos de música contemporânea.
MAKING OF DO CLIPE:
O vídeo é surreal em sua própria natureza – graças ao trabalho sensacional de Moya, que buscou reminiscências do filme épico alemão Metropolis – e mesmo assim, consegue ser divertido e inovador, conseguindo combinar os truques do teatro com as infinitas possibilidades da mídia audiovisual para conseguir fundir, de forma eficaz, temas filosóficos e modernos. Para a SPIN, Marc Hogan descreveu o vídeo como representante da “conformidade distópica” em que a sociedade atual vive.
É tudo muito estranho, mas assim é também a obra de St. Vincent. E por isso funciona.
Diretor: Chino Moya | Ano: 2014